terça-feira, julho 03, 2007

A lebre e a tartaruga

Dia 25: O herói e o anti-herói

A lebre e a Tartaruga:
Era uma vez uma lebre que tinha tanto de veloz como de convencida.
Uma tartaruga que, no seu lento caminhar, ouviu tanta “gabarolice”, acabou por desafiar a vaidosa lebre:
– Eu tenho a certeza de que, se apostamos uma corrida, eu serei a vencedora.
A lebre, inicialmente, incrédula com as palavras da tartaruga, partiu o “côco a rir”:
– Uma corrida? Eu e tu? AHAHAHAHAH! "Tá bem abelha"!
– Será que cheiro a medo? – ripostou o cágado.
– É mais fácil choverem vacas do que eu perder uma corrida contigo, mas já que insistes… – respondeu a lebre.
No dia seguinte, as duas colocaram-se no ponto de partida. Bastou soar o sinal de largada para a lebre desaparecer no horizonte. A tartaruga, entre o rasto de pó deixado pela lebre, deu início à sua carreira.
A lebre estava tão segura de que seria a vencedora que decidiu fazer uma sestazita:.
"Se aquela pisa-ovos me ultrapassa, é só correr um pouco que a alcanço na boa" – pensou.
A lebre dormiu tanto que nem se apercebeu quando a tartaruga a passou. Quando acordou, e se deu conta da situação, já não foi a tempo de remediar o sucedido.

Outra lebre e outra tartaruga
1978, dois países da África Ocidental, ambos compartindo a vizinhança dos Camarões e dando os primeiros passos e trambolhões de uma indepêndencia de tenra idade. No primeiro país, Nigéria, nasce uma lebre chamada Francis. No entanto, o uníco que une Francis e a lebre da fábula de Esopo é a sua velocidade. Aos 16 anos, Francis refugia-se em Portugal depois de representar a selecção nigeriana de juniores nos Campeonatos de Lisboa. Tudo apontava para que Francis fosse mais um exemplo do africano procurando a sorte na Europa, realizando trabalhas físicos e duros, ilegal e convivendo com realidades crueís. Na verdade, os primeiros anos foram assim, trabalhou como trolha, viveu na rua, e só a sua determinação e amor ao atletismo fizeram com que hoje seja um dos desportistas Portugueses mais admirados. Até o seu processo de naturalização foi um calvário... (ai Francis, se fosses futebolista!) Foi campeão Europeu e Mundial, e pelas medalhas olímpicas que conseguiu, alcançou o estatuto de herói. Apesar de tudo é um tipo porreiro e humilde de caractér, e por essa razão nunca poderia ser a lebre que La Fontaine recontou.

No segundo país, Guiné Equatorial, e igualmente no ano de 1978, nasceu Eric. Com 21 anos, aprendeu a nadar numa piscina de 20 metros num hotel de luxo. Graças a um wild card oferecido a atletas de países carenciados de estructuras desportivas, e 6 meses depois de ter sentido o cloro de uma piscina pela primeira vez, Eric pôde participar numas Olimpíadas. Nadando sozinho (os outros dois atletas foram desqualificados), os 112 segundos que durou a sua prova ( o recorde mundial é de 47 segundos) foram os mais aplaudidos de todo o evento e os mais angustiantes para Eric (segundo ele, nunca se cansou tanto em toda a sua vida). Esse mais de minuto e meio garantiu-lhe o título de anti-herói das olímpiadas, e hoje, é conhecido em todo o Mundo, mais do que o nadador que atingiu os 47 segundos na mesma prova! Duas lebres, duas tartarugas, dois africanos, um herói, um anti-herói.... por um lado, a admiração do primeiro Mundo pelo esforço e pelo sacrificio, por outro a compaixão no seu estado mais puro, uma espécie de racismo nobre e caridoso.

Francis, de apelido Obikwelu, é um tipo feliz, faz o que gosta, está rodeado daqueles que quer, vive num país tranquilo e onde é admirado ( mas onde também sofreu – convem não esquecer).

Eric, tampouco é uma personagem fictícia. Existe, chama-se Eric Moussambani, conseguiu baixar o seu tempo pessoal nos 100 metros livres para menos de 1 minuto, mas não pôde participar nos Jogos Olímpicos de Atenas por questões burocráticas ( que ironia!), desenvolveu o novo estilo de natação, o “cachorrinho”, e ainda hoje tem um clube de fãs.

Moral da história: Nunca apostes uma corrida com uma tartaruga!

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